domingo, 20 de março de 2011




Era hoje que o fenómeno ocorreria. A Lua estava no local mais próximo dos últimos 18 anos.
À parte as marés serem grandes e uns pares de jovens revelarem à beira - mar os efeitos da testosterona a ferver, nada mais faria crer que andaríamos aluados.
Aos sábados a feira é um motivo de passeio, pelo menos enquanto se vai ao mercado encomendar a Raia para fazer uma “Arraia alhada”, como dizem os algarvios, ou comprar os jornais, ou tomar um café na esplanada junto ao mercado que fervilha de estrangeiros e nacionais que mercam as suas produções como se fazia há centenas de anos.

É tranquila esta Olhão.
Comecei a receber mensagens e telefonemas dos filhos. Do Luís, o meu varão: “Viva meu pai. É só para lhe dizer que não tenho sido bom filho, mas posso adiantar – lhe que quanto mais vou vivendo e mais velho fico, mais gosto de si. Seu filho Luís”. Em silêncio, a olhar os turistas, os mendigos, os pescadores, os feirantes que pareceram ter ficado fixos, numa imagem turvada, desapareceram e eu lembrei aquele menino lindo que no meu próprio dia de anos, já lá vão bastantes, veio ao mundo para me dizer quanto vale a pena viver. Enviei – um beijo só de amor com um obrigado.
Pouco depois era os outros ao telefone; o Miguel a pregar – me um raspanete porque foi lá a casa e eu não estava, depois o Ricardo a falar comigo e a avisar ao mesmo tempo: “não vires isso Nono. Não vás para aí Nono, pára, pára… depois eu ligo. Beijo!!!… “e por último o João que mesmo sendo sábado, saía de uma pós graduação em fiscalidade empresarial. Sem ter consciência disso, este filho segue as pisadas do avô. A estranha matéria está no seu ADN. Como eu gostaria que os meus filhos e netos guardassem de mim a imagem de admiração e respeito que eu cultivo do se avô. Não a mereço.
E quando a “arraia” estava prevista para ser apreciada no Aries, o Fausto descobriu uma casa onde havia Xarém. Sem qualquer dúvida protelámos o anunciado peixe voador para a noite.


O Xarém não estava o que eu esperava. Eles gostaram, mas eu que até sou boa boca… não. Monótono, um pouco seco, pouco aliciante e sem surpresas de maior. Admito que o meu pai, gostava disto, mais por ser deste local quase africano, que lhe falava da sua infância, do que, pelo encanto gustativo. Prometemos continuar na senda do Xarém, porque existem variedades e alguma há - de ser, a tal.
Resolvemos pescar. Fomos no bote do Sérgio. No estofo da maré - cheia víamos algumas tainhas e douradas aos saltos, mas no anzol, nada. Nem queriam o isco, minhoca da boa e langueirão que mais mereceria um arroz, coisas que ofendem o mais infeliz dos pescadores.
Horas, sob um sol acariciador e um mar que parecia um Banho Maria, fingíamos que pescávamos. O Sergio falava das suas conquistas em França, na Holanda, em Miami e no Brasil, O Fausto acabou por atar a linha e sacou do seu frenético sudoku e eu lamentava a falta de amor que vai pelo mundo e cá por casa.
O Sérgio é um dos melhores gastrónomos que conheço; cria pratos como um poeta repentista quadras, mas de pesca, com a maior variedade de canas e outros apetrechos que tem, não escolhe, nem o local, nem a hora certas. Em resumo; já cansados resolvemos acostar ao Arca de Noé e fazer uma sardinhada.



Num cenário inesquecível, de fazer parar a respiração, sob uma lua esplendorosa, onde se liam as crateras, os continentes e os mares que imaginamos, as sardinhas, deliciosas que o “Noé” descobriu, desfilaram, apoiadas numa bela salada, um Altano tinto nos “trinques”, uma sopa tipo `Nono”, como ele diz e por último, porque nos faltava a sobremesa, criou bananas assadas com casca, coisa nunca vista por mim, mas que acompanhada por gelado inesperado, subiu como uma estrela na noite que terminava luminosa e alta.

1 comentário:

  1. O autor do texto escreve bem mas também não fica atrás do artista fotógrafo - Que maravilhosa Lua! Não estava lá mas a imagem compensou-me um pouco da ausência - Adoro o luar, e, sempre que me desloco à minha aldeia, procuro fazê-lo por alturas da lua-cheia: faço vida de gambuzino: ando por lá a vadiar pelos penhascos. E até já tenho tropeçado nos javalis. No fim de contas, dado o barulho que fazem na retirada, parece que ainda se assustam mais de que eu. Mas é muito agradável contemplar o luar naqueles ermos silenciosos. Porém, à falta desse prazer, resta-me a consolação de, mesmo vivendo na cidade, fazer vida solitária: são quase sete da manhã, ainda não me deitei - Não deambulo à luz da lua mas escrevo ao som de belos acordes de música clássica. Valha-me ao menos isto - Parabéns amigo - E continue a dar-nos o prazer da sua escrita. E venha daí também um livro, porque, talento, não lhe falta.

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