segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

CONVERSAS COM O MEU UMBIGO nº5

-Acabo de chegar de Lisboa. Detesto ir a Lisboa.
-Passaste lá a tua vida.
 -Sim, mas agora os 30 kms parecem cada vez mais 5. Estou mais distante.
-Mas Lisboa está mais bonita.
-Não sei.
-Nem eu ... dizem.
-Está diferente e as pessoas também.- afirmei peremptório.
-Estás é cansado.
-Não, esgotado. Acho que já disse tudo o que tinha a dizer, mas fui falar para uma mão cheia de jovens. E eles são o futuro. É importante que saibam de onde veem.
-Sim. Mas antes até gostavas.
 -Desta vez na Escola António Arroio sobre, imagina ; A Comunicação Social e o 25 de Abril.
-Disso sabes tu... lembrou o meu umbigo, como o mais intimo confidente, que me tem acompanhado em tanta circunstância e tanta latitude-.
-Lembrei – lhes que a história é o que os vencedores contam. Os derrotados calam – se para mais tarde verterem a sua versão, nem sempre real ou exata.- Numa contração senti – o esboçar um sorriso. -E tu o que lhes contaste?
-Falei, falei durante uma hora . Cheguei a emocionar – me ao descrever os sonhos que nasceram naquele. Sonhos que não nos largam. – Não entendi o que ele disse mas continuei. – Os jovens pareciam distantes, como se lhes falasse de um filme de ficção passado na lua. Não era com eles que se propõem trabalhar na Comunicação Social. Duas raparigas de cabelos longos e unhas descomunais parece que adormeceram agarradas às mochilas que encabeçavam sobre as carteiras. Os restantes olhavam aparentemente sem ouvir, entorpecidos. Exceção para dois ou três que acenavam com a cabeça, um sorriso e pontos de interrogação no olhar, até se despediram com uma salva de palmas.
-Palmas?
 -As que acordaram também, claro.
Fizemos silêncio como se cada um de nós, eu e o meu umbigo pensássemos em coisas distintas.
-Ainda aí estás? – Perguntou ele que adora conversar.
-Sim, estou. Estou a ver que esta juventude com tanto futebol, tanta raspadinha, tantas festas e espetáculos vive uma vida que não será a sua.
-Já te tinha avisado.
-É verdade mas...
-Mas o quê? Poe isso de lado... pensa mais em nós.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

CONVERSAS COM O MEU UMBIGO nº 4

ÀS vezes envergonho – me de falar com ele. Não é que alguém  nos ouça e me critique, mas porque não consigo manter uma conversa coerente, lógica, frutífera. Passo – me, bufo que nem um hipertenso. Uma desgraça, enfim.

-       Não te acanhes Pá -  disse ele que me conhece melhor que ninguém e que agora já me trata por Pá.Repara, os umbigos não servem só para isto como um marco num descobrimento. Não sou apenas um nó que me liga a ti. Mesmo que não queiras sou a tua consciência.
-       A minha consciência, mas eu nem tenho consciência como tu me avisaste um dia. Lembraste?
-       Eu disse – te isso?
-       -Sim quando um dia vim para aqui dizer que o homem, seita de que eu não me orgulho de pertencer, é uma desgraça, e que apesar de tanto folclore isto continua um caos de violência, de injustiça...- ia continuar mas ele atalhou- Sim lembro – me, aliás desde que nos conhecemos que não mudas de música. Eu dei o nó e daqui não saio mas tu já podias ter imaginado uma luz ao fundo túnel e ido em frente.
-       - O pior é que não vejo luz nenhuma para seguir em frente. A vida parece um arraial de parvoeiras semeadas pelas religiões, pelos políticos e por uma estupidez atávica da condição humana.- E o pior???? - Disse o umbigo à espera de uma tirada mais forte. Sem o ver imaginei – lhe a expressão e metralhei. - E o pior é que ambos caminhamos cada vez mais depressa para a morte e, até agora, nada mudamos à nossa volta.
-       E estava combinado mudarmos?
-       Claro porque pensas que vieste ao mundo ou melhor; para que pensas que vieste ao mundo? Foi para te coçares e empurrares tudo com a barriga?
-       O umbigo encaixou.
-