é um desabafo, uma dor de alma, um grito vertido assim, a medo, mas com uma vontade enorme de mudar o mundo, ou apenas mudar o autor.
sábado, 27 de outubro de 2012
quinta-feira, 18 de outubro de 2012
CAPITULO X ( texto a incluir em trabalho mais vasto)
O hábito de, diariamente, logo pela manhã, tomar o café, ou seja, a
tradicional bica, ler o jornal e fumar um cigarro de enrolar, o único do dia,
levava – o a descer do Siroco para o bote e depois de remar um pouco, acostar à
muralha de Olhão. António Gil, de mochila às costas, como qualquer mareante,
porque espaço e mobilidade são bens preciosos a bordo, senta – se na esplanada
onde uns quantos locais, o olham, apontam e comentam a sua presença. Os mais
assíduos já o cumprimentam com um aceno afável, como se fosse um pescador, ou
um qualquer reformado, igual a muitos que não largam a borda de água, num
lamento permanente.
Mal se senta, a empregada diligente de avental e touca branca, traz – lhe o
café cheio que é imposição deste cliente, tal como um cinzeiro, mesmo estando o
chão repleto de beatas.
As primeiras páginas dos jornais inspiram – se nos noticiários da rádio com
que acordou. Fala – se do tradicional amorfismo calculado, de um Presidente da
Republica que depois de ter ajudado a enriquecer uns quantos e a empobrecer uns
milhões, da degradação e da ineficácia de um Governo, incapaz de salvar o País
que se afunda diariamente, dos ministros com acções anedóticas, da incapacidade
de uma Justiça que deixa prescrever ou se escusa, em leis dúbias e
escorregadias, por onde se salvam ilustres personagens, depois fotos de
manifestações de “indignados” de policias, de enfermeiros, de professores, de agricultores,
de jornalistas, ao lado de notícias sobre o crescendo da pobreza em numero,
onde ingressa a classe, até aqui média e o enriquecimento dos mais ricos, da
injustiça para com os reformados que descontaram dezenas de anos para a sua
reforma e que agora o Governo dela se apropria para, diz, pagar aos credores
estrangeiros, isto enquanto o mais elevado aumento de impostos, não equitativo,
faz doer a quem trabalha, ao mesmo tempo que aos empresários, originando uma
estagnação de mau agoiro. A noção de país e de nação esboroam – se, quando como
nunca, por sugestão do próprio primeiro - ministro e outros líderes radiosos, a
juventude parte para o estrangeiro, em busca de trabalho e de futuro. António,
nem levantava os olhos das 48 páginas do diário. Não deixou porém de estranhar
o que à primeira, poderia parecer uma nova alvorada para a informação no seu
país, uma lufada de liberdade, quem sabe se redentora; a tomada de posição de
alguns jornais ou Tvs corajosos, frente a grupos financeiros e económicos, nos
quais envolvem o PR, ministros e gente grada da vida pública. Céptico, como vem
estando, nos últimos tempos, logo fica com a sensação de que por detrás, estão
escandalosos jogos de corrupção, de grandes negócios de obras públicas, de
privatizações, o mesmo é dizer, da venda de património e da soberania
nacionais. Não lhe saem da memória, conhecidos comissionistas, cujo currículo
até já aparece nos jornais e Tvs, individualidades a soldo de entidades
estrangeiras, conseguem com os escritórios de advogados e deputados
interessados contractos surrealistas e transferem os nossos haveres e o nosso
futuro para grupos financeiros da China, Angola ou Alemanha, conforme o lobby
que vença numa ou noutra modalidade, electricidade, águas, estradas nacionais,
Tvs, seguros, saúde etc.- O país está a saque –
Quando levantou os olhos, passou uma ambulância a apitar assustadoramente.
Pensou no hospital para onde alguém iria e relembrou as dezenas de exemplos que
recentemente encontrara na degradação dos Serviços Públicos de Saúde, numa
acção que visa estrategicamente privilegiar a entrada dos grandes capitais na
saúde privada. Sentiu como que num enjoo, aquela sensação que se tem quando se
está frente à constatação de um assalto, de um crime, perpetrado com minucia e
onde à priori, não haverá punição. Pensou tomar mais um café, mas desistiu. Já
tinha taquicardia que chegasse.
A esplanada ficava entre os dois mercados reconstruidos em 1916, com
inspiração árabe, em tijolo castanho, com minaretes e torreões, como sentinelas
viradas para o mar e para África. Nos lados extremos dos dois grandes blocos,
jardins com frondosas palmeiras, plátanos, euracádias e miospores. No lado sul
balançam – se iates de vários tipos e origens que tanto ficam umas horas, como
umas semanas; 2 holandeses, 1 inglês e 1 alemão e 1 sueco, desde os modernos
trimarãs até aos, mono - cascos de ferro, ou madeira, que, pelo aspecto,
lembram muitos anos de tempestades e vida dura. No pavilhão do lado nascente, o
mercado da fruta, de poente, o do peixe. Com frequência e por curiosidade
olfactiva percorria – os com a atenção que um ignorante revela. A profusão de
peixe fresco, alinhado sobre as bancas e a sua beleza apesar de mortos, que
poucas horas antes eram seres vivos e presumivelmente felizes. Sardinhas, peixe
- espada, raias, cavalas, pescadas, safios, garoupas, atuns gigantescos e uma
infinita variedade de vivalves e afins, com ares de quem não teve uma morte
tranquila, aguardam compradores. Tão odorífero como este, só o espectáculo do
outro pavilhão; laranjas, melões, maças, peras, uvas, beterraba, romãs figos
amêndoas, alfarrobas, tudo o que esta terra algarvia dá em profusão e
qualidade. Além dos tentadores frutos secos e os doces regionais; D. Rodrigos,
morgados de amêndoa, figos cheios, almendrados que deliciam qualquer guloso.
Depois era ali que dava a entrada formal, no seu dia.
Jaziam a chávena da bica vazia, a embalagem do açúcar, não violada e o
cinzeiro com a beata. Levantava a cabeça e como numa cena panorâmica percorria
os quase 360 graus;. À frente, outra esplanada, esta não em vermelho, mas com
cadeiras, mesas e guarda - sois amarelas. Turistas com ar próspero e feliz, de
chapéus e bonés de corres garridas, tomam chás com leite, cafés e alguns bebem
a primeira de muitas cervejas, ao mesmo tempo que comem torradas e aprendem a
gostar dos doces da região. Eles, na maioria, de cabelos brancos e calções
garridos e elas, loiras, em trajes, que nas suas terras, por certo, não
ousariam no dia-a-dia; saias até aos pés, ou calções, onde mal cabem, ou colans
justíssimos, sob camisolas, ou t shirts largas. Mendigos, cada vez mais, vêm
serpentear pelas mesas de mão estendida a pedir ou simular a venda de lenços de
papel, sabonetes ou pequenos sacos de ameijoas ou berbigão que foram apanhar na
ria. Na mesa ao lado um jovem magro, de barba negra crescida e cabelo
desalinhado pede umas moedas. Pergunta “Não me dá uma esmolinha? Tenho fome”. A
resposta é mais uma nega. António olha - o e lamenta que o jovem, além de
revelar a miséria em que vive, por certo avolumada pela necessidade de droga,
mostra falta de saber mendigar. Jamais deveria começar por uma negação: não me…
Seria muito mais sucedido se peremptoriamente perguntasse: “Dá me uma esmola?”
Até para se ser mendigo é preciso saber. Qualquer dia haverá cursos. Pagos,
claro. Passa um homem que veste umas calças, só com uma perna, T. shirt branca.
Vem de canadianas. Pára junto ás correntes que guardam o passeio empedrado da
ria que passa 3 metros abaixo. Um outro, de camisa às riscas verticais, a puxar
um cão branco malhado de castanho e bem tratado, fica a falar com o coxo.
António imagina o diálogo de ambos. É a conversa de toda a gente resumida num
desabafo “Que vai ser de nós?”
Junto ao portão de ferro que dá acesso ao pontão para a replica do caíque
Bom Sucesso que em 1808 tripulado por pequeno grupo de pescadores de Olhão
partiu para o Brasil afim de comunicar ao Rei D. João VI a retirada das tropas
invasoras de Napoleão, três jovens sentam – se em dois caixotes do lixo. Não é
difícil adivinhar que a sua preocupação já não é o futebol, nem o desenrolar da
Casa dos Segredos. Um deles era o filho da vendedeira que não há muito
interpelou António Gil, num apelo para que ele lhe arranjasse um emprego. A
mulher, vestida de preto e com sofrimento no olhar e na voz – O senhor veja lá,
o meu filho tem 25 anos. Tirou no curso de gestão que bem me custou, gastei
quase dez mil Euros e não tem emprego. Já se inscreveu no partido para ver se
arranjava para a Camara ou coisa assim, mas não. São muitos a quererem. Olhe,
anda a acartar fruta e a vender, algum peixe que lhe dão. Pobre rapaz-
Junto à primeira boia vermelha, um veleiro francês de 40 pés, lançou ferro.
A eólica tal como a bandeira de origem e a portuguesa, mais acima e a
estibordo, como é de lei, não param de se manifestar. Um casal já de meia -
idade desce para o bote com um pequeno motor. Virão a terra à descoberta. Que
pensarão deste país?
Num banco virado para o mar uma mulher sentada sacode permanentemente a
cabeça e a perna que cruzou com a outra. Magra. Parece ser pobre. As roupas bem
passadas estão tom – sobre – tom, com algum gosto sóbrio. Sapatos pretos,
rasos, mala à tira - colo, também preta. Casaco de malha castanho claro sobre
blusa branca e saia castanha escura às pregas. É frequente naquele local, às vezes
com os cabelos a agitarem - se ao vento . A cara já mostra rugas provavelmente
do sol pois ela não escolhe o bom ou o mau tempo. Os olhos são verdes, tímidos
e raramente saem do horizonte, mas quando olha alguém, fixa como quem dispara.
Parece estrangeira mas dizem que é portuguesa e que ficou assim depois de um
desgosto de amor. Veio para aqui e cá ficou. António pensou em tempos, abeirar
– se dela. Começou por a cumprimentar. Primeiro admirada, depois educada passou
a responder. Mais tarde, viria a ser ela a saúda – lo, em primeiro lugar,
fazendo pausa no seu movimento eterno. A curiosidade jornalística susteve – se.
Ela teria segredos que guardava em si, como num túmulo e ele jamais cometeria
esse sacrilégio.
domingo, 1 de julho de 2012
A protagonista
Esta jovem, particularmente bonita e inteligente, de nome Penny, com 4 anos, filha ilegitima, de uma Pitchon e de um Cão de dÀgua, que vive neste momento, com o meu amigo Sérgio do navio Arca de Noé, na Ria Formosa - Olhão, será protagonista de um livro de que sou autor e que vai na 350 página.
Com esta personagem, ficaremos a saber como é possivel uma pequena e gentil cadela entender e ser entendida por humanos, ao ponto de com eles partilhar alegrias e sofrimentos, num dia a dia, nem sempre fácil para uns e para outros.
Esperamos dar aqui mais informações sobre a referida personagem e fazemos todos os esforços para conseguirmos, com ela, uma reveladora e empolgante entrevista.
domingo, 3 de junho de 2012
O FORA D`HORAS
Dormir num barco fora de água, a mais de 4 metros do chão é pior que dormir num galinheiro.
Os sons não têm nada a ver com o mar, o vento bate e a resposta é rígida, inesperada e dura. Há ruídos que no mar não se ouvem e que aqui, parecem impróprios e intrusos. Não há o balanço convencional nem as estrelas a espreitar pelas vigias.
O camarote estava quente. Faltava a água e a brisa marítima, para refrescar e adormecer.
Talvez pelo calor e pelo cansaço, adormecera cedo para acordar pouco depois.
Por isso, vira – se acordado, ainda não passava da meia - noite. Um barulho estranho preocupou – o. Todos os barulhos não habituais, são preocupantes.
Pensou ser a bomba dos fundos a funcionar. Não era, nem a das águas putáveis, nem a das águas sujas, nem o bilge blower. Não era o rádio da mesa das cartas nem a tv. Meteu a cabeça na arca congeladora. Nada. Ficou com o perfume de uma morcela que comprara recentemente em Ayamonte e que cheirava que nem uma espanhola no dia de S. Fermin. Cheiro estranho mas a única companhia com um pão integral, comprado na Padaria do Povo e uma cervejola.
Subiu as escadas e pôs o pescoço de fora. Um cemitério de naves convalescentes, mortas, moribundas ou a dormitarem. Esqueletos de algumas a lembrar o fim.
Calçou um chinelos de enfiar no dedo, abeirou – se da escada e desceu com alguma dificuldade, não fosse estatelar – se, daquela altura. Lembrou – se de nessa manhã, ter perguntado, a um jovem que polia a pintura exterior se alguém já morrera por ter caído daquela escada.
Ele tirou a mascara e disse que sim.
Antes de se pôr novamente a trabalhar explicou que fora um pescador que ao descer, caíra e que quando chegou o 112, já estava azul. Para acalmar o cliente, adiantou que devia estar com os copos, ou ter tido um ataque cardíaco.
Respondi – lhe que não desgostava da cor, mas que não era nada cómodo espatifar – me entre tubos, madeiras, utensílios de todo o tipo.
Em cuecas, tronco nu e chinelos desci a lembrar a história. Ali, estava particularmente escuro. Aproximei – me do ruido. Dois cães armados em guardas mas afinal maricas e até simpáticos vieram ao encontro. Entrei sorrateiro num pequeno pavilhão de madeira.
Dois homem, debruçados sobre uma carcaça de um barco de uns 4 metros aplicavam o madeirame.
-O que é isto? Vem pregar – nos, um susto, ou fazer uma reportagem?. Trás o microfone? Escondeu – o nas cuecas.- Desataram a rir que nem uns desgraçados.
O processo de colocar madeiras direitas num casco curvo, mereceu – me particular atenção.
Colocavam a madeira de cambala, ou pinho fixando – a com pregos e apertos, depois de a molharem ao mesmo tempo que a queimavam com um maçarico.
Vira uma vez uma explicação de uma operação estética – cirúrgica, à espinha de uma vítima de um acidente. Não variava muito do que ali testemunhava.
Vim a saber que haviam desenterrado aquele esqueleto que deveria ter aí uns 100 anos. Resolveram devolver – lhe a vida e fixavam uma tábua por dia.
- Quando é que estará pronta?
- Lá para o Natal.- E voltaram a rir que nem uns desgraçados.
A sair ainda perguntei com o se chamaria a interessante observação.
Ficaram a pensar. Interrompi – lhes o pensamento : Chamam – lhe O FORA D`HORAS.
- Boa . Foi a resposta
Pouco depois voltava a enfiar – me na cama. Espreitei para a lua enquanto pensava quão interessante era a o trabalho que aqueles homens, um dono de um restaurante em Olhão e o outro calafate, impuseram a si próprios para fora de horas. Dar vida a um barco quando ele a perdera. Lindo, sim, porque os barcos têm vida. Os homens é que quando a perdem, não têm gente assim para os ressuscitarem. Quando tentam ressuscitar, apedrejam – nos. Muitas vezes enterram – nos vivos, para nunca mais serem vistos e jamais navegarem.
NO ESTALEIRO
A ideia da viagem, até ao fim do mundo, avança na minha cabeça.
Há que preparar o ARIES para a grande jornada. É um veleiro dos mais resistentes, seguros e confortáveis. Fabricação inglesa, o Iate da Rainha, como anunciam, (100 vezes menor).
Quem vai ao mar, avia – se em terra. Precisa ir a seco.
Eram 8 da manhã, o sol já brilhava havia muito tempo, a garantir mais um dia lindo.
Na Ria, nem ponta de vento, nem borbulha na água. Só de quando em vez, peixes aos cardumes, fazem pela vida. Parecem felizes, mas estarão? Num momento, centenas de tainhas e outros, salemas, parecidas com douradas, resolvem seguir uma, que deve ser a chefe e bem ensaiadas, ágeis, fazem uma pirueta, como uma formação militar a virar à esquerda ou à direita. Dão um salto colectivo que mais parece a aproximação de uma baleia. Na política dos homens, os tubarões e as tainhas fazem o mesmo.
De resto, uns pássaros, guarda – rios, gaivotas, mergulhões, flamingos, garças, cegonhas e patos, fazem rasantes à agua e alguns ao mastro. Um ou outro atreve-se a pousar na borda. Nem um pescador na apanha da ameijoa ou berbigão, porque as zonas de cultivo ainda estão submersas.
A maré ainda enche, mais uma hora. É altura para, com segurança, levar as 19 toneladas, ao local onde será limpo, retocado nas beliscaduras do mau tempo e da mareação, reforçar velas, forçar mastros, rever luzes de sinalização, instalar plotter e radar, estes, até agora, num armário sob as estantes dos livros, a aguardarem a aventura.
Mal avistamos o estaleiro, um trabalhador acenou – nos. Era ali.
Já sabia que era o estaleiro que obedecia mais aos hábitos tradicionais que aos modernos.
Nada de gruas, elevadores, nem rampas especiais.
Como se fazia há 500 anos ou até, talvez desde o primeiro barco, uma rampa de travessas fixas ao solo, devidamente engorduradas e uns apetrechos no mar, são o suficiente para o mestre Victor garantir uma boa aterragem. Por este processo tem erguido centenas de grandes embarcações de pesca de carreiras e de transporte com muitas toneladas.
Visto do mar, mais parece um cemitério de embarcações, na maioria de pesca e de madeira. Poucos iates e naves em fibra. Embarcações com ferimentos, bem visíveis, porque o tempo desgasta e o mar é traiçoeiro.
O processo de encalhe é medieval, ou mais antigo ainda: três pontos determinam o enfiamento. Uma bóia, a uns 150 metros da rampa, com os madeiros, a 50 metros a sobressaírem da água, duas estacas que são as partes laterais do berço ou carro. Estas hão - de amparar o navio até, que em terra, seja devidamente escorado.
O piloto é avisado que deverá, colocar a embarcação de ré, virada para a bóia e a proa apontada ao meio das anteparas do berço que afloram à superfície.
Porque não é fácil estabilizar como se pretende, dados a inexactidão dos gestos do skipper por mais experiente que seja, os ventos e as correntes, um cabo duplo é fixado da bóia à ré, indo aumentando a distância conforme se avança. Das anteparas partem dois cabos, um para bom- bordo, outro para estibordo, afim de se garantir a simetria milimétrica da manobra.
Agarrado ao leme, pensei que estes gestos artesanais, mas sensíveis, terão sido repetidos milhões de vezes na história da navegação de todo o mundo e naturalmente pelos nossos antepassados do tempo em que eramos uma povo de marinheiros e pescadores.
A dada altura, sobe para bordo o mestre. O piloto deixa de comandar. Sem leme é o mestre que, com os seus cálculos, medindo os nós, pré - feitos nos cabos laterais, palmo a palmo, centímetro, a centímetro, coloca, com ordens e gritos, a nave no berço - carro.
Após a garantia da boa manobra, o berço, já com o precioso objecto seguro, é puxado, agora por um pequeno tractor colocado em terra. Outrora, terão sido homens e juntas de bois a fazer este impressionante esforço de tracção.
Após uns minutos de alguma tensão e perigo, travessas, sobre travessas, engorduradas, deslizam com ranger de casco e de cabos, até se imobilizar. Dá – se por terminada a manobra e inicia - se a obra.
É altura de voltar à lista das condições essenciais para que a viagem não redunde num naufrágio.
Ainda há tanto a fazer.
O mestre Sérgio, sócio do mestre Victor, delicadamente indaga, com oportunidade, se tenho Carta de Alto Mar.
-Não, só de Costa,- respondi, como se, quando a vontade é superior, houvesse limites à alma e engenho humanos.
Depois, pensei no itinerário, nos alimentos, medicamentos, comunicações.
Quanto à carta, veria mais tarde. Para já, queria partir, perder – me no horizonte.
terça-feira, 29 de maio de 2012
AGORA?
Sentei – me no Park Caffé, de que gosto particularmente, aqui, em Olhão. É moderno, as linhas são direitas e proporcionais. É simples. As linhas rectas tranquilizam - me, dão – me confiança. Não tem nada em excesso. O lado norte, está sempre à sombra e é fresco. O lado sul, virado para um grande relvado dá para esticar a vista e sentir que nem tudo é encavalitado. Esta sensação leva – nos a creditar que não estamos a mais. Não acotovelamos ninguém.
Jovens e velhos. Uns conversam, outros lêem os jornais, enquanto, lá dentro a olhar sem interesse na que salta de uma taróloga a vender a banha da cobra para uns “comis”, comissários da comunicação a fazer o mesmo que a taróloga. Uma tristeza. É esta a nossa sociedade, numa cidade que ficou no meio.
O dono, Carlos Morais, é um jovem professor de educação física, que gosta de restauração. É comunicativo, sabe ouvir e aprender. Gosta do desafio. Tem uma visão moderna das necessidades do cliente e do negócio. Soube disso, quando, na véspera, fui comprar bilhetes para o concerto de António Torrado no Centro Cultural, ali perto e ele quis oferecer – me uma bebida.
Hoje, porque tem wirless abanquei, no espaço norte, com o PC aberto.
Umas senhoras, já de alguma idade, mas com ares de raparigas modernas:- Olha quem está ali? De barba crescida… e toda branca.
- É ele não é?.
Enfiei a cabeça no teclado.
- O senhor fuma?
- Às vezes.
- Faz bem. Posso levar o cinzeiro?
- E lá foi, para direita, depois de cravar um cigarro, a um senhor que estava ao meu lado esquerdo e que, ao que parece, era seu conhecido do facebook.
Perguntei – me como é que duas pessoas que devem ser vizinhos, se vão conhecer, no espaço cibernético.
Tentei entrar no computador, mas a claridade era muita. Adiei.
Ao lado, estava já outro senhor aí dos seus 40 e poucos a conversar com o tal do facebook. Ambos com ar evoluído, de calções, chinelos e óculos escuros.
-É pá isto está tudo f….Então estes cabrões, é só roubar, só roubar e nós a ver?
-Não há quem os encoste à parede? Onde é que eles vão pôr o dinheiro que nos roubam?
-No estrangeiro e olha, aí, nas brutas vivendas que tu vez por este Algarve fora. Os gajos, tratam – se bem. O Salazar é criticado porque vendia a nossa imagem de “pobrezinhos, mas honrados”. Agora o 1º Ministro põe – nos, conscientemente, cada vez mais pobres e honrados. Honrados por sermos nós a pagar o que a classe dirigente, os seus amigalhaços e os Bancos, desviaram. E como isto não chega vendem o País que não construíram.-Isto não vai longe, não. Se pudesse dava um estrondo?
-Um estrondo?
-Sim, fazia barulho.
-Mas como? Onde? De que é que valia? Ninguém te apoiava. Somos uma cambada de cobardolas.
-Mas toda a gente pensa assim.. acredita. Vou é alistar – me num partido. Não quis, foi o pior que fiz.
Eu, fiquei de mãos a suar. Apetecia – me entrar na conversa. Dizer – lhes que há qualquer coisa a fazer, mas que se poupava muito sacrifício, muito sofrimento se houvesse outra comunicação social, que com isenção, sem representar grupos de interesses esclarecesse a população. Ainda fiz menção de falar. Juntei os jornais, meti o PC, no saco, paguei e pensei em não falar. Eles levantaram – se também e lá foram lamentando.
Não falei. Fala – se de escutas, de espiões, de bufos, de perseguições. Senti o mesmo arrepio que senti pouco antes do 25 de Abril, quando num café em Lisboa me virei contra um homem que procurava ler o texto que escrevia e que se destinava à imprensa estrangeira.
-Vá se quiser, prenda – me, vá. O que estou a escrever não é mentira nenhuma…- Estrilhei. O homem meteu o rabo, entre as pernas e cavou a expirrar chamas pelos olhos. Já nessa altura, eu estava com o espirito da perseguição. Voltei a ter uma crise. Agora?
domingo, 27 de maio de 2012
ESTAMOS NA MISÉRIA
Toda a gente
a pedir. Nunca tal foi visto no nosso país. Esta é a realidade que nos
envergonha.
Quase um
milhão sem trabalho. Gente para a rua por já não ter casa. Famílias
desesperadas.
Já não há
classe média. Há a rica e a pobre.
É triste ver
as campanhas que o poder promove ao fazer apelo ao que chamam solidariedade, à
mendigância, ao salve – se quem poder. Aumenta a violência. Rouba – se na
banca, no cobre dos fios eléctricos, nas batatas da horta , tudo vale para
meter ao bolso.
O Banco
Alimentar, ou seja, as campanhas cada vez mais, frequentes às portas dos
supermercados, para socorrer os mais carecidos de nós, é verdadeiramente
aviltante.
Nesta fase,
quando um povo tem que mendigar para viver, só podemos concluir que se deve à
incapacidade dos seus governantes.
Serem
incapazes de proporcionar aos cidadãos o mínimo para viver, com dignidade é a
prova de que nada estão a fazer a não ser encaminhar a pouca riqueza, que nos
resta, para o bolso dos seus patrões. A economia manda na politica e não o
inverso.
A população,
pobre e não esclarecida, ainda dá de si própria. Condoída, como num acto nobre,
dá esmola : “Hoje sou eu, amanhâ poderei
ser eu a precisar. Não posso ver ninguém com fome. Temos que nos ajudar uns aos
outros.”
E ignora que
quem poderia dar efectivamente, não dá nada, nem o que tem em excesso.
É
intolerável.
Dar esmola
avilta quem recebe e envergonha quem dá.
O que é
preciso é outra política, outros líderes.
Estes não
sabem em que país vivem. Se sabem, não
respeitam os cidadãos que neles votaram. É uma mentira, um logro que urge
corrigir e se possível, castigar.
Mas tudo
continuará enquanto não houver órgãos de comunicação livres do controlo
económico e financeiro.
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