terça-feira, 6 de novembro de 2018

O TI LARANJO




Uma madrugada destas, sonhara comigo mesmo, em menino, quando morava em Sassoeiros e com 11 anos ia diariamente até Lisboa para na Estrela  frequentar o Liceu Pedro Nunes.
Mas o que destacara no sonho era a rotina das manhãs a sair com o Ti Laranjo, um homem a rondar os oitenta anos, carregador de bagagens nos comboios da linha de Cascais. Ele e a tia Raquel, da mesma idade, nossos vizinhos, eram um casal muito feliz que casara pela igreja havia pouco, porque a Prof.ª da Escola local insistira, e eu, eu acabara por ser o padrinho de casamento. Íamos e vínhamos diariamente juntos num trajeto onde como dois camaradas íamos aprendendo coisas, um com o outro. De casa 2 quilómetros até à estação e depois até Lisboa. Ao  fim da tarde voltávamos ao mesmo ritmo lento mas conversador.
Ele era de baixa estatura, redondinho e a trajar umas calças, casaco e boné azuis que perderam já a cor e qualquer vinco. Cambaleava ao andar e segurava um saco com o almoço quando ia e que se segurava num dedo dançando vazio no regresso.
No início do século passado o meu amigo fora soldado de Mouzinho de Albuquerque e imaginem, participara em África, Moçambique na prisão do famoso Gungunhana.
Como me lembro dos episódios que ele me relatava como numa telenovela diária em que o seu comandante era o seu, melhor, o nosso herói. Às vezes parávamos na estrada pouco concorrida, para aflorarmos algumas passagens.
Como apreciei aqueles momentos da minha vida. Que saudades.
E acordei precipitado, a pensar em recordar tudo, tudo, mas não me lembrava do nome da mulher  do TI Laranjo. Levantei – me precipitadamente para perguntar à minha mãe... mas também já morrera há mais de 30 anos. Parecia que estava ali. E não estaria?


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