Uma
madrugada destas, sonhara comigo mesmo, em menino, quando morava em Sassoeiros
e com 11 anos ia diariamente até Lisboa para na Estrela frequentar o Liceu Pedro Nunes.
Mas o que
destacara no sonho era a rotina das manhãs a sair com o Ti Laranjo, um homem a
rondar os oitenta anos, carregador de bagagens nos comboios da linha de Cascais.
Ele e a tia Raquel, da mesma idade, nossos vizinhos, eram um casal muito feliz
que casara pela igreja havia pouco, porque a Prof.ª da Escola local insistira,
e eu, eu acabara por ser o padrinho de casamento. Íamos e vínhamos diariamente
juntos num trajeto onde como dois camaradas íamos aprendendo coisas, um com o
outro. De casa 2 quilómetros até à estação e depois até Lisboa. Ao fim da tarde voltávamos ao mesmo ritmo lento
mas conversador.
Ele era de baixa estatura, redondinho
e a trajar umas calças, casaco e boné azuis que perderam já a cor e qualquer
vinco. Cambaleava ao andar e segurava um saco com o almoço quando ia e que se segurava
num dedo dançando vazio no regresso.
No início do século passado o meu
amigo fora soldado de Mouzinho de Albuquerque e imaginem, participara em África,
Moçambique na prisão do famoso Gungunhana.
Como me lembro dos episódios que ele
me relatava como numa telenovela diária em que o seu comandante era o seu,
melhor, o nosso herói. Às vezes parávamos na estrada pouco concorrida, para
aflorarmos algumas passagens.
Como apreciei aqueles momentos da
minha vida. Que saudades.
E acordei precipitado, a pensar em
recordar tudo, tudo, mas não me lembrava do nome da mulher do TI Laranjo. Levantei – me precipitadamente
para perguntar à minha mãe... mas também já morrera há mais de 30 anos. Parecia
que estava ali. E não estaria?
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