sábado, 3 de novembro de 2018

Em Olhão o Chef Harmand


-->
            Em tempo de pós - férias para esquecermos os calores, aqui vai uma breve história de Verão.


Há meia dúzia de anos eu, meio navegador - velejador vi – me forçado a atracar na Ria Formosa junto a Olhão para uma breve reparação no casco do meu navio. Puxaram – me para o estaleiro e aí fiquei durante três dias. Porque era pouco tempo permaneci na embarcação e lá pernoitei. Logo na primeira noite o silencio das altas horas, foi quebrado por um discreto batuque a que um marinheiro não está habituado - A esta hora? – Perguntei eu a mim próprio, intrigado. Desci do Aries pela escada exterior com cuidado e pé ante pé, entre esqueletos de embarcações, andaimes e acessórios náuticos aproximei – me daquele ritual. Sob uma luz discreta dois homens debruçavam – se sobre uma pequena embarcação de madeira que estava a ser ressuscitada.  Fiquei a observa – los com admiração, mas os magos descobriram – me e eu curioso, depois de identificado, fui ouvindo: era uma embarcação há muitos anos naufragada que quereria voltar a navegar. Depois de longas madrugadas de trabalho, era tratada com um carinho desusado a que eu chego a chamar amor. Já estavam nos pormenores finais e ela parecia feliz nos vernizes e cores sóbrias e delicadas que a embelezavam. O carpinteiro na sua vida não náutica fazia acabamentos em janelas, portas, tetos, móveis e tudo a que se chama “carpintaria de limpos”.
Agora só lhe faltavam as velas. Só?, não, porque o sr Armando, o comandante do restauro, num desafio, me pediu que lhe desse um nome. E num repente chamei – lhe Fora d`horas.
Dias depois, como o previsto voltei ao mar e fiz – me ao vento, mas ao longo destes anos vi passar várias vezes o Fora d`horas, esbelto no seu verniz castanho, elegante, suave e convicto ante a admiração de quem gosta de barcos e ali se habituou a admira – lo.
Passaram os anos. 
Uma noite destas fui ao centro de Olhão. Exatamente nas ruas caraterísticas onde já não passam carros e os turistas se acotovelam, resolvi entrar num novo estabelecimento, convidativo pela sua original decoração com madeiras no interior e exterior e com peixe a saltar, entre aspas, para o nosso apetite. 
 Mandei vir sardinhas que me estavam a fazer falta. Devorei – as tranquilamente com um belo vinho e uma salada “à montanheira”, enquanto empregados, um francês outro espanhol e outro ao que me pareceu alemão, corriam lestos e simpáticos de um lado para o outro.
Estava eu já com a última, sobre a imprescindível fatia do pão, como é tradição de Olhão que já suportara mais umas nove e agora pejada do suco impar,  pronta a ser leiloada, quando ao meu lado descubro empertigado o Chef; sapatos e calças brancas, sob um avental longo, azul, colocado com arte e um casaco branco com botões dourados, tipo general herói da 2ª Guerra Mundial. Um lenço azul com suaves riscas a condizer na cabeça e na elegância, encimava um rosto meu conhecido e desta vez, imaginem com um inesperado e insinuante brinco de oiro na orelha esquerda.
Era, nem mais nem menos, que o talentoso e romântico carpinteiro de limpos.
Felicitei – o pela surpresa; dois restaurantes à altura de Olhão e na linguagem atual sob o seu talento, como impõe o turismo promissor.
Quando lhe perguntei quem fez isto tudo olhou – me, não conseguindo esconder uma justa dose de vaidade e a justificar - se, arregaçou os ombros e disse irónico – Foi--- Fora d´horas”-.
Ele, o Chef veio lembrar – me esse barco lindo que naquela noite distante me acordou.
- Vendi – o. Não tenho tempo para tudo -.
- Sim agora é Chefff ! - e apontei para o seu aprumo.
- Sim mas, mas, preciso de um nome – Confessou segredando – me.
Eu disse que  ia pensar, mas ainda faltava o doce que não dispenso ou seja,  a tarte de figo, alfarroba e amêndoa e depois em apoteose a inseparável aguardente de medronho para “lançar ferro”.
Já desaparecera a tarte quando o cheiroso copinho chegou. Era o Chef acompanhado pela esposa quem o trazia.
- Muito obrigado Chef Armammd.
E logo a gentil mulher do Chef que a tudo assistia e ajudava sublinhou. - Sim senhor. Chef Harmand...  pensou mais um pouco – e ...com H?
- Simlaro,  com H e sem O acrescentei,  encantado.



Sem comentários:

Enviar um comentário