segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

CONVERSAS COM O MEU UMBIGO nº3





-Ainda aí estás ou fugiste? Disse eu, para adiantar, meio divertido e outro meio preocupado –
-Estou sempre no mesmo sítio. Tu é que não.
O meu umbigo tinha razão. Eu é que nem sempre me encontro por tão distraído andar neste turbilhão de emoções, promessas, sonhos e decepções.
-Ao que vens? Lança ele desconfiado como sentinela guardadora nem sei de quê.
-Já sabes que lamentavelmente te procuro ou encontro por acaso quando preciso ou penso que preciso.
-Ainda bem. Então o que soubeste que tanto te preocupa?
Senti vergonha. Se pudesse ,como se fosse um menino tímido e complexado, teria apagado o que disse. De qualquer modo pensei agita – lo ou sacudi – lo para ver a sua reação. Abreviei – Olha , segundo recentes estudos fidedignos.
Ouvi um – Sim!!! Carregado de ironia, mas continuei – Estudos dignos de confiança dizem que 99% da população mundial é pobre e que 1%, só 1% detém toda a riqueza.
- Sim?
-E que as 66 famílias mais ricas detêm mais de metade dessa riqueza.
-E tu onde te situas.?
Fiquei surpreendido com a pergunta, , diga – se de passagem, afinal lógica e até oportuna.
Tentei defender – me.- Eu? – Como se fosse o culpado desta proporcionalidade.
- Sim  tu. O que fizeste para mudar isto?
- Eu?
- Sim tu, ou não vives , não comes, não falas , não gritas neste mundo que pisas?
Num relâmpago senti que não existo. De nada sirvo. Pensei para mim baixinho – Se calhar nem existo mesmo. E exclamei  num desabafo talvez aterrorizado : - ---Meu Deus.
-Teu Deus?  Teu Deus’ – Pausa - E Deus, Deus existe?
Respirei fundo até sentir os pulmões empurrarem o coração ou sei lá, o que tenho dentro.
Fico sempre assim que falo com ele.






sábado, 16 de janeiro de 2016

CONVERSAS COM O MEU UMBIGO nº2




Parabéns, fizemos anos e não disseste nada.

É verdade. Sabes quanto mais festejamos mais perdemos futuro. Faço e pronto, está feito.
Eu também sou assim, mas tu é que mandas.
Bem, repara, nós somos íntimos. -Disse isto passando com a mão suavemente como numa festa a um velho amigo.
Íntimos. Acho que ultimamente até de mais.
Talvez
Antigamente, banhinho de imersão, ultimamente duche uma chapada de champô e depois a toalha a secar.
Mas agora começamos a conversar mais. E sabes porquê’?
Porque me chateia conversar com gente que não me entende nem sabe ou quer entender.
Ou tu é que não és fácil de entender.
É a dificuldade que nos separa e sem obstáculos não vamos a lado nenhum.
Onde é queres ir afinal?
Ir até encontrar respostas a dúvidas existenciais e fundamentais.
Quais?
Porque estamos aqui?. Porque não somos todos felizes, apesar de tantas doutrinas, religiões e democracias.? Porque, dizem, sendo o homem um animal inteligente, o mundo está a criar a todo o momento razões para ardermos numa grande e inextinguível fogueira ?
 Olha eu sou só o teu umbigo. Um amigo que apesar de ser o centro de ti não passa disto, repara engordo a olhos vistos.
Olhei até com alguma dificuldade  e atalhei para terminar – Olha ... faz flexões.
Ai sim? Diz ele zangado - e tu ... continua com as tuas ... reflexões.


quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

CONVERSA COM O MEU UMBIGO nº1







Perguntei ao meu umbigo – Como estás pá? – Eu falo assim com ele -
-      Estou bem, cá vou, um pouco em baixo mas vou indo. Não notas?-
-       Há que tempo que não te via.-
Eu noto mas finjo que não o vejo. Não lhe ligo. Ainda não é obstáculo à paisagem nem às relações sociais. E ele continuou – E o que me dizes do 2015 que se foi?
-      Para mim tudo bem. As coisas parece estarem a mudar. Agora são mais a discutir e já se sabe; da discussão nasce a luz.
-      A luz ? A luz para quem vê, agora eu que tenho uma venda quase o tempo todo...
-      Engoli em seco, ele tinha razão mas continuei a falar – lhe com o queixo encostado ao peito ao mesmo tempo que suspirei. Ele deu logo conta disso encolhendo – se não sei se de vergonha se de arrepio. – Mas não somos só nós - adiantei consciente que não tinha dito nada. É sempre assim. Até agora nunca fomos a lado nenhum.  Ia a virar – lhe as costa e atirei - lhe.
   - Já reparaste que os ricos estão cada vez mais ricos e cada vez há mais pobres?
       - Sim e sabes porquê? Porquê?
Não lhe dei resposta. Apertei o cinto até o sentir incomodado e desliguei a luz.