segunda-feira, 14 de julho de 2014

MINHA TERRA MINHA PELE

Começo
a dar sinais de disfunção psíquica, o mesmo é dizer que estou a ficar marado. Acordo
de madrugada no Aries. A RDP diz – me que em Portugal desde há 2 anos cresce o
numero de mulheres grávidas que entram nas maternidades em estado de fraqueza
porque têm fome. Muitas, em consulta, têm que ser alimentadas com urgência
porque o bebe ainda na barriga não reage devido ao enfraquecimento da mãe. Nem
quero acreditar. Isto no meu País. Arrepio – me. Deixo o Aries e no exterior o
mar tranquilo. O dia está lindo. O Sol promete. Vou a terra.


Compro
o jornal e bebo um café cheio.Depois
conforme ia acordando ia abrindo os olhos. No Jornal Público pág. 12 aumenta o
número de crianças dos 6 aos 12 anos vindas de Angola e do Congo, traficadas,
com destino prioritário à Bélgica e Inglaterra, com o objectivo de serem
adoptadas para abusos sexuais, prostituição e trabalhos domésticos. Na mesma
página a madeirense de 23 anos, Lígia lamenta não estar no seu casebre, em
Porta do Sol, na festinha dos 2 anos do seu Daniel e na companhia da mana
Mariana que tem 4 anos.
É
que ela encontra – se no Estabelecimento Prisional de Cacela a aguardar
julgamento. É que há 4 meses tentou vender o Daniel a estrangeiros.
Estou
acordado, não duvido, mas sinto um vómito crescente. Volto à embarcação. Vejo –
me ao espelho e não gosto de mim, nem da minha pele.

PS –
vou tatuar na minha pele uma frase,
necessariamente feia .Se alguém ler este texto agradeço uma sugestão.







sábado, 12 de julho de 2014

RIA FORMOSAOnde a população abusou e o direito naufragou.



Fui hoje rever Armona, esta ilha do Levante da Ria Formosa, frente a Olhão onde estou atracado no Aries.
Sabia que à volta das várias ilhas intensifica – se a perseguição aos que por aqui construíram ao longo dos últimos 40 anos, a torto e a direito, sem eira nem beira em terrenos pertencentes ao Estado isto é a todos nós portugueses.



Excepto um reduzido número de pescadores, cidadãos mais ou menos endinheirados ou com muita coragem e “lata” assentaram arraiais para as férias das suas vidas, para seus negócios e ostentação. Sintomático é ver que muitas dessas casas hoje já pertencem a espanhóis, holandeses, alemães e franceses que apenas mostram que sabem escolher e têm posse.


Neste e nos outros paraísos da Ria oportunisticamente cresceram como mosquitos no Verão proprietários de casas a poucos metros das magníficas águas cálidas e serenas. Ao mesmo tempo os que lá tinham já erguido sorrateiramente uma casinha reduzida, fizeram – na crescer para um lado e para o outro, para cima, num emaranhado de telhados, paredes, espreguiçadeiras, barbecues, como sementeira de uma Benidorme louca e patética.

domingo, 6 de julho de 2014

NO CHARCO

Regresso à Ria Formosa, à geometria de Olhão, à vida simples de simplesmente eu reduzido a batráquio, a apanhador de bivalves a leitor compulsivo a escrevedor frustrado (todo o escritor é frustrado porque se o não fosse não voltava a escrever, escrevia o que tinha a dizer e pronto, como afinal o leitor também o é; insaciável), a cliente da Padaria do Povo.
Mas daqui coloco os óculos sem graduação a não ser a minha e vejo o azul do céu e do mar e qual milagre, experimento uma visão mais clara da vida deste País que não sai do charco onde se meteu e a vergonha inunda – me como as marés mais cheias. Vejo – me nu, como sou, sem poses, nem rodriguinhos, nem salamaleques, num quadro de Davinci entre anjos e demónios.

Adormeço com medo de acordar.