domingo, 17 de abril de 2011

entrevista na SIC



Estava no barco, quando, entorpecido pelos sons do relato de futebol Porto - Sporting e pelo noticiário da tv, comecei por desligar a TSF e depois passei para a Sic. Nem de propósito; a minha cara na entrevista que a Ana Paula Almeida, jornalista do Balsemão, me fizera há 15 dias. Detesto aparecer assim.
Por coincidência, 3 ou 4 dias depois, encontrei esta jornalista, bem simpática por sinal, no restaurante do seu Pai, um senhor que conheço há muito no Fiorde em Tires, onde vou de quando em vez e tenho de voltar por causa da lampreia.
Não sei se a reportagem começara há muito, mas creio que não. Queria saber o que faço nesta altura. Fiquei, ou se calhar mantive, a cara de estúpido com que ando muitas vezes e disse que dedicava agora mais atenção à família, aos animais, que fazia umas locuções na Via Satélite e que escrevia, escrevia em blogues e gostava da experiência.
Depois, aparecia a brincar no jardim com a minha cadela Mia, a siberiana de olhos cinzentos, enquanto a locutora dizia o que eu não garanti, que estou a ultimar um livro que observa o mundo da comunicação em Portugal e promete revelações importantes.
Não é bem isso. Não é comunicação em Portugal, não ultimo coisa nenhuma, nem sou aquele idiota que falou há momentos no telejornal.
Cada cavadela uma pedra. Quem me autorizou a dar a entrevista? Mais valia que estivesse calado. Não sei guardar um segredo. Nunca mais aprendo.
Mas, agora reconheço que se não disse qualquer coisa estúpida e banal não interessava porque afinal, é apenas isso que interessa às Tvs e a quem as dirige.
Ó menos o Porto ganhou.

tomar notas é preciso...mais do que nunca



“Para compores (grupos de) figuras em quadros históricos – depois de teres estudado bem a perspectiva e de já saberes de cor as partes e formas dos objectos – deves sair, observar, estudar e anotar constantemente as circunstâncias e o comportamento dos homens, quando estão juntos, conversam, discutem, riem ou lutam. Deves observar as acções dos próprios homens, bem como as dos presentes que os separam ou se limitam a olhar.
Toma notas com traços leves num pequeno livro, que deves ter sempre contigo. Deve ser de papel colorido e que não possa ser apagado, uma vez que essas coisas não devem ser apagadas, mas sim preservadas com grande cuidado, porque as formas e as posições dos objectos são tão infinitas que a memória é incapaz de as reter a todas, pelo que deves mantê – los (os esboços) para te servirem de guia e de mestre.”

Assim falava mestre Leonardo em 1500.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

UM GRANDE AMOR



Fui ao estaleiro. O Aries terá de vir a seco para a inspecção pelas autoridades. É a enfermaria dos nobres barcos, receptáculos de tantos sonhos, de viagens feitas e de viagens por fazer.
Lá estava o Arca de Noé do meu amigo Sérgio. Trata dele como de um parente próximo. É a sua velhota. O Arca de Noé que tem cem anos é a paixão, o mundo, o reino deste homem que um dia disse não à loucura da cidade e lançou ferro ao mais profundo da alma, para assegurar a sua paz.
De madeira, com um século, este barco de pesca transformado em iate de luxo tem cumprido aristocraticamente a sua missão, mas o reumático a dada altura ataca todos. E ali está combalido mas nunca moribundo.
Tratado com carinho como sempre; uma travessa aqui, um gel, acolá e voltará a ser a suite de um belo hotel flutuante.
Bons ventos para o Arca de Noé e para o seu comandante

POR MARES E MARÉS



Ainda por ali, descobri este outro veleiro, ou melhor, uma caravela, mas de origem chinesa, a agonizar num descampado próximo.
Tem mais de 20 metros. Todo em madeira de alta qualidade, com incrustações soberbas, com um porte altaneiro. Deverá ter sido uma embarcação linda a sulcar ondas e a enfrentar ventos por esse mundo fora.
Lembro – me de a ter visto, há meia dúzia de anos, na Marina de Vila Moura, onde gozava de saúde e era motivo de frequentes elogios, mas a vida dos barcos é como a dos homens… tem momentos difíceis.
Consta que veio até cá sob as ordens do seu dono e timoneiro chinês, que escolheu estas paragens para morrer. Seu filho, voou até ao Algarve para se desfazer da herança do pai, mas ninguém se atreveu a marear com esta embarcação para nós, difícil e estranha, apesar de bela.
Até alguém mais corajoso, acabou por a comprar. Mas o tempo é mais feroz que a vontade dos homens e dia para dia, o altaneiro barco chinês vai ficando alquebrado, perdendo o brilho e o porte saudoso dos bons velhos tempos de glória.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

O fusivel da CP




Hoje dei a minha primeira resposta ao histerismo nacional. Resolvi vir de comboio de Lisboa até Olhão. Gastaria um décimo do que gasto como automobilista e não teria trabalho de motorista de longo curso.
O País está em crise. Grita – se por todo o lado como se a crise não estivesse há muito na consciência dos menos distraídos.
Pensei que, antes que o FMI me obrigue, diria não à Brisa e à Galp dois dos expoentes da nossa trágica condenação. Não se pode ir a lado nenhum que não tenhamos que pagar para lá e para cá, às crescentes e asfixiantes portagens desta tentacular concessionária de auto – estradas. Ao mesmo tempo diria, não, à petrolífera distribuidora que se esforça por manter no pais mais pobre da Europa, os preços mais elevados, ante a clara aquiescência dos senhores da Entidade Fiscalizadora.
E lá entrei em primeira classe, em Entre - Campos, munido de computador e alguns livros, não fosse por acaso desviado, ou sequestrado.
A carruagem parecia fretada a uma associação da 3ª idade. 90% dos passageiros são da 3ª idade porque estes gozam de 50% de desconto. (12 Euros) Boa!!!!. Havia casasis algarvios e alentejanos que pareciam festejar as bodas de ouro.
Estava feliz a apreciar esta concordância entre necessidade e direitos, quando o cobrador veio comunicar que uma avaria de, já alguns dias, um fusível, não permitia que houvesse ar condicionado na carruagem de 1ª classe “Se quisessem, que fossemos para a de 2ª”.
Recostei – me no assento, saquei do PC e avancei para o windows. A dada altura, tive que ligar à electricidade. Nada. Chamei o comandante. Que não era possível, primeiro porque os fusíveis pifam e depois, porque “esta carruagem não tem estabilizador de corrente”.
Não, nem isto iria estragar a minha vingança e o prazer de dizer não à crise. Emalei o pc e saquei do Corrier. De quando em vez, as localidades sucediam – se. Desviava a leitura para o exterior, já alentejano, com sobreiros e oliveiras até ao horizonte, bordado por flores brancas, como mantos de neve nesta primavera. Achei lindo, até sentir apetite.
Um cafezinho e um queque bastariam até chegar a Olhão onde avançaria para uma pizaria como o Napoleão por Itália, pensei.
Lavar as mãos. WC livre, corri. A torneira, nem pinga e o secador nem bufa. O almirante sorridente “É dos fusível”. Paciência, vai um cafezinho? perguntei cordial, para esquecer o filho da puta do fusível. Não. Não. Diz – me o porta - voz: A máquina não funciona, mas tem cerveja que não está fresca mas…
Voltei ao meu lugar sem desanimar.
3 horas e tal depois de Entre Campos, entrava em Faro onde mudaria para Olhão.
Corri para as casas de banho. “Só há esta”, apontava um funcionário da companhia, sorridente à espera da minha cara ao olhar para uma caixa metálica, cheia de ranhuras, que colocaram no meio da gare. Procurei uma moeda. Não tinha troco. Era só para lavar as mãos. Supliquei. O solícito e divertido recepcionista sugeriu que fosse ao café. Espreitei. Faziam "bicha" para o WC. A chave andava de mão em mão.
Comecei a ter vontade de urinar.
Embarquei no outro CP, para chegar a Olhão.
Com a mala com rodinhas que me perseguia, tão enfurecida como eu, subi ao Aries onde antes de tudo, tomei um duche compensador.
Enquanto devorava a prometida piza com camarão, pimentos, tomate e todo o menu de outros acessórios, reconhecia, para mim mesmo, que para a crise o melhor é sorrir e enfrenta – la com determinação, mesmo se o FP do fusível não funcione.